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quinta-feira, 13 de novembro de 2014

MANIFESTO CONTRA A MORTE DE JOVENS NA PERIFERIA

Manifesto contra a morte de jovens na periferia

Por: Araripe Coutinho *


Imagine uma canoa que começa a fazer água. Desesperados, seus ocupantes passam a remar furiosamente, na busca por alcançar terra firme antes que todos afundem. Só que parte rema para um lado; parte, para o outro, enquanto todos trocam acusações sobre a quem cabiam as responsabilidades pela devida manutenção da canoa. O leitor provavelmente não se espantaria se o resultado de tal drama hipotético fosse um naufrágio.


Esse preâmbulo é uma analogia com o cenário atual em Sergipe. O Governo do Estado atrasou salários de servidores – o que é de fato lamentável -, porém, ao invés de toda a classe política se unir em ações propositivas, visando encontrar uma alternativa viável, verificou-se uma saraivada de críticas que, neste momento, em nada contribuem para a resolução do problema. Trata-se de um movimento que apequena a política partidária, ao priorizar uma contenda mesquinha, quando a gravidade dos fatos requisita espírito público posto acima de tais questões.

Ainda que ideologicamente eu esteja em campo de oposição ao governador Jackson Barreto, acredito ser obrigação de cada político se dispor a ajudá-lo no enfrentamento a dificuldades de ordem econômica que, como se sabe, não são exclusivas de Sergipe. No dia 31 passado, por exemplo, reportagem no Bom Dia Brasil, da Rede Globo, teve como título “Rombos estaduais chegam a R$ 8 bi e falta dinheiro até para gasolina”. A matéria questiona os respectivos governadores, ao afirmar que “é isso que acontece com quem gasta mais do que podia”, mas faz a ressalva de que a situação se agrava “porque os Estados ainda têm outras dívidas, milionárias, de longo prazo, como as feitas com bancos e com o Governo Federal”.

Na nota emitida pelo Governo de Sergipe para explicar o atraso no pagamento do funcionalismo – “excepcionalmente”,

segundo o texto -, o problema é atribuído “às constantes quedas nos repasses do Governo Federal, principalmente do Fundo de Participação dos Estados (FPE) que esse ano vem acumulando quedas consecutivas, podendo fechar o exercício de 2014 com uma frustração de cerca de R$ 200 milhões, somado ao aumento exponencial das despesas com a previdência pública estadual, que até o mês de setembro consumiu R$ 540 milhões dos cofres estaduais e aponta para um déficit de R$ 750 milhões até o final de 2014”.

Conforme divulgou o Banco Central no final de outubro, só no mês anterior, setembro, União, Estados, Municípios e empresas estatais amargaram um déficit de R$ 25,5 bilhões - o pior resultado desde 1994, quando o Plano Real foi implantado, e também um recorde negativo desde que o regime de metas fiscais foi criado, em 1999.

A crise é ampla e apenas alianças regadas à sensatez podem fazer frente a seus efeitos nefastos, os quais vão recair, como de hábito, na qualidade de vida dos brasileiros. Especialistas já sinalizam um aumento de impostos como a única saída para o ajuste das contas públicas, ou seja, a fatura da irresponsabilidade fiscal será paga por todos.

Qualquer família organizada do ponto de vista financeiro sabe que tempos de crise demandam apertar os cintos. Sob esse prisma, é salutar que o Governo de Sergipe tenha informado o propósito de “tomar diversas medidas necessárias para redução de despesas na máquina pública”.

Movido pelo espírito colaborativo que aqui exalto, passo a propor algumas providências para contenção de gastos que, a rigor, já vinham sendo cobradas antes mesmo de se tornarem tão concretamente urgentes, inadiáveis. Uma delas é o próprio redimensionamento da máquina pública. Ao implantar efetivamente a meritocracia - critério que deveria pautar

as contratações, mas usualmente relegado ao enésimo plano, por força de conveniências políticas -, o Estado conseguiria reduzir cargos em comissão com justiça, valorizando e mantendo apenas os que de fato cumprem suas funções com eficiência e denodo.

Na mesma lógica da meritocracia, sugiro ao governador Jackson Barreto que pense na possibilidade de extinguir cargos de adjuntos e, mais além, de reduzir o número de Secretarias de Estado pelo instrumento de fusões ou, quando couber, assumindo corajosamente que, na relação custo/benefício, não se justifica a manutenção de uma pasta – ou de quantas se encaixarem nessa métrica.

A administração pública, em qualquer esfera, não transcende a exatidão matemática. Quando os gastos são superiores à arrecadação, os problemas financeiros são inevitáveis. Postergar a racionalidade capaz de ao menos minimizá-los a um ponto aceitável é tarefa que o gestor tem a obrigação de abraçar, sob pena de, como aconteceu, deixar de cumprir no prazo correto um pacto essencial: o pagamento da folha.

O governador Jackson Barreto tem em seu caminho a adoção de medidas impopulares, que seguramente vão ser questionadas. Porém, citando uma expressão bem conhecida, “não se faz omelete sem quebrar uns ovos”. Como um político cuja prioridade é o bem de Sergipe, estou disposto a contribuir no que for necessário para sanear as finanças do Estado.

Criticar é bem mais confortável do que apresentar sugestões, mas oposição por si só não melhora a vida do povo de Sergipe – e é com esse povo que firmei meu compromisso.

A escalada da violência no município de Aracaju não é uma surpresa para quem acompanha a cidade e se debruça sobre

seus indicadores. A maioria dos bairros não tem nenhuma biblioteca pública, não tem nenhum equipamento esportivo público, os postos de saúde não têm, na sua maioria, medicamentos; as delegacias, fim de semana, estão fechadas e não há nenhum centro cultural. Em todo o município, há proliferação de favelas, enquanto centenas de jovens entre 15 e 19 anos estão fora da escola, metade da população jovem, entre 15 a 24 anos, está desempregada e milhares de crianças (170 mil) necessitam de vaga em creche pública. Para se deslocar na cidade, o aracajuano passa em média 2 horas e 23 minutos por dia no trânsito (o equivalente a um mês por ano) e o transporte público, nos horários de pico, oferece condições sub-humanas. Para serem atendidas por um médico no posto de saúde público, as pessoas esperam em média 66 dias; para fazerem exames em laboratório, mais 86 dias; e, para procedimentos mais complexos, mais 178 dias.

Este é um cenário perfeito para que prosperem a criminalidade e a violência: extremas carências, enorme desigualdade gerando frustração e revolta pela injustiça, ausência do poder público e falta de oportunidades de trabalho, educação, cultura e lazer para jovens de baixa renda, além de serviços públicos de educação, saúde e transporte de baixa qualidade (as pessoas de maior poder aquisitivo e até os responsáveis pelas políticas públicas pagam para usar serviços). Para combater a violência, é claro que precisamos de uma polícia competente, amiga da comunidade, bem capacitada para exercer mais a prevenção do que a repressão, de policiais bem remunerados e honestos, de um sistema prisional que recupere as pessoas para o convívio social, de uma justiça ágil e honesta. No entanto, enquanto não mudarmos o quadro social e econômico e pensarmos apenas em aumentar a repressão, enquanto não atacarmos as raízes dos problemas, estaremos apenas realimentando a espiral da violência.

No bairro Industrial várias vidas estão sendo ceifadas e quer ver coisa é na Terra Dura, bairro América, Manoel Preto, e

na grande Aracaju também como Marcos Freire, Eduardo Gomes, Fernando Collor de Mello e etc. Não podemos nos calar diante dessa barbárie, muitos vítimas de latrocínio, outras por porte de drogas e tráfico, quase sempre justificado pela dita sociedade, como “marginal, drogado, desocupado, ladrão”. Como se ali não tivesse uma pessoa, uma família. Nós queremos nossos jovens felizes. Tomando sorvete com a namorada sem medo, andando no bairro com orgulho do lugar que mora, queremos nossos jovens VIVOS E NÃO MORTOS, queremos nossos jovens livres de balas, humilhação, tristeza. Queremos políticas públicas efetivas para nossos jovens, queremos chorar de alegria por termos passado nossos filhos no vestibular, e não por terem morrido no silêncio das balas por uma pedra de crack de 10 reais. Precisamos urgente incentivar a aplicação de penas alternativas à prisão e a descriminalização de condutas, de modo a romper com a lógica do encarceramento em massa e combater a superlotação prisional.

Aprimorar a apuração da responsabilidade de agentes públicos acusados de praticar atos de violência e de violar direitos

humanos. Investir no acesso à justiça, estimulando o fortalecimento e a autonomia da Defensoria Pública. Precisamos desmontar redes de corrupção e criminalidade, identificar as lideranças dessas redes e combater a corrupção e os grupos de extermínio.

São medidas de curto prazo que devem ser tomadas, levando-se em conta a situação de guerra civil que vivemos em Aracaju, a qual atinge principalmente a população mais pobre e vulnerável das periferias da cidade. Conclamamos igualmente aos cidadãos e cidadãs, as entidades da sociedade civil, as empresas a empunhar estas bandeiras e se empenhar em colaborar dentro de suas possibilidades e de sua esfera de poder e de influência, ajudando nossa cidade a tornar-se uma cidade de paz, justa e sustentável, uma cidade que ofereça qualidade de vida para todos os seus habitantes.

Precisamos estimular a criação de espaços comunitários destinados ao fortalecimento de vínculos de solidariedade entre os membros da comunidade, bem como para a mediação e solução de conflitos interpessoais, com a participação dos serviços públicos essenciais. Queremos que todas as religiões somem-se ao nosso projeto. Que o Ministério Público Estadual e Federal unam-se no combate à violência e punam os culpados pelos seus gestos, suas atitudes criminosas, muitas vezes impunes. Rogamos, pois a Deus, força e coragem para que este Manifesto seja recebido pela sociedade, e que possamos tomar parte desta realidade que assola principalmente nossos jovens como o Elvis, homenageado hoje com um painel, pintado por um grafiteiro de nome Feik do bairro e Joões, Antonios, Paulos e recentemente também o Samurai, um ser que meditava na orlinha do bairro Industrial, barbaramente assassinado sob os olhos do sol.

Fica então, aqui, o nosso Manifesto: das mães, das famílias, daqueles que não têm voz, órfãos do poder constituído e institucionalizado, fica aqui a nossa dor. Que possamos construir uma sociedade de inclusão, mais humana, mais justa e mais pacífica. Entidades constituídas e presentes.


*Araripe Coutinho é jornalista do Jornal da cidade em Aracajú, poeta, ícone aracajuano, ex assessor de Clodovil Hernández ,representante da Anistia Internacional e um grande e verdadeiro amigo.

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